Apresentação
O I CONGRESSO INTERNACIONAL ROUSSEAU X KANT – UFMA, o III CONGRESSO NACIONAL JEAN-JACQUES ROUSSEAU – UFMA: ESTÉTICA E REPRESENTAÇÃO e o I CONGRESSO KANT – UFMA: LIBERDADE, JUSTIÇA E DIGNIDADE, da Universidade Federal do Maranhão é uma iniciativa do GRUPO DE ESTUDO E PESQUISA INTERDISCIPLINAR JEAN-JACQUES ROUSSEAU – UFMA (GEPI ROUSSEAU) e do GRUPO DE ESTUDO E PESQUISA INTERDISCIPLINAR EM KANT – UFMA (GEPI KANT), coordenados respectivamente pelo Prof. Dr. Luciano da Silva Façanha e pela Profa. Dra. Zilmara de Jesus Viana de Carvalho. Os dois Grupos são filiados ao NEPI - Núcleo de Estudos do Pensamento Iluminista. Os três Congressos centrados no mesmo evento, tem por objetivo a integração dos vários orientandos da iniciação científica, da Graduação e da Pós-Graduação, bem como de pesquisadores da comunidade acadêmica do país e do estrangeiro, cujas pesquisas se relacionam à obra do pensador genebrino Jean-Jacques Rousseau e do pensador prussiano Immanuel Kant. Tal evento, pretende abarcar a diversidade de trabalhos e reflexões desenvolvidas atualmente acerca da filosofia de Rousseau e de Kant e suas implicações com as ciências humanas e sociais, na perspectiva em que insira a Universidade Federal do Maranhão no debate internacional e nacional sobre os temas estudados acerca destes filósofos.
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), filósofo iluminista, de grande envergadura, muitas vezes restrito ao escaninho da política, é observado na atualidade como o precursor de diversas questões, estando inclusive no cânone da história da filosofia. Renovador capital dos problemas da ontologia, epistemologia, ética, além de uma concepção inovadora da linguagem, que segundo a crítica especializada, unifica a obra do filósofo da Ilustração. Aliás, o porte da obra desse filósofo se dá, sobretudo pelo fato de ser desenvolvida “uma ideia de linguagem absolutamente original, e em tudo estranha àquilo que seus pares iluministas e outros filósofos até então haviam pensado.” Nesse sentido, Rousseau recoloca a política no cerne da linguagem, e isso é uma resposta interessante a um problema específico dos séculos XX e XXI.
Para o antropólogo Claude Lévi-Strauss, Rousseau é um crítico do cogito cartesiano, e fundador das ciências humanas. Ao contrário de Descartes, que procura fundamentar toda ciência na certeza da existência do “eu”, Rousseau, segundo Lévi-Strauss, questiona essa centralidade do “eu”, percebendo, antes de diversos outros pensadores, que o “eu” é determinado desde um “outro”, desde o lado de fora, e que não existe sem essas determinações.
Mas, além disso, há uma articulação de sua filosofia com a estética, passando pela literatura, música, teatro, festa, romance, escritos autobiográficos, educação e política em seu pensamento, podendo se encontrar uma chave de leitura de problemas fundamentais da filosofia contemporânea da linguagem e do sujeito.
Immanuel Kant (1724-1804), sem dúvida, através da sua filosofia crítica, representa um marco no pensamento moderno do séc. XVIII, uma filosofia que se apresenta como sistema, portanto, com pretensões a pensar a razão em sua totalidade, isto é, tanto do ponto de vista teórico, quanto prático. Quanto especificamente a sua filosofia prática cabe assinalar que esta não apenas se pretende como uma compreensão acerca da sociedade civil, da vida civilizada, da política, da moralidade, da religião, enfim do homem, mas de como todos esses aspectos ligados a vida humana podem ser melhorados através da filosofia e da educação, e, de um modo geral, através da ação do homem no mundo, isto é, da ação autônoma, livre, sendo esse melhoramento uma espécie de dever e de telos e, portanto, de compromisso que devemos ter para com as gerações vindouras. Poderíamos dizer que Kant entendia e defendia como nossa, a obrigação de fazer do mundo um lugar melhor para a espécie humana e isso viria também do desenvolvimento da técnica e da ciência, mas de modo algum se confinaria a este. Em outras palavras, não seria possível na visão kantiana melhorar o mundo sem melhorar o homem; logo, só os benefícios produzidos por um mundo técnico-científico, que equivaleria aos benefícios de um mundo civilizado, entendido como fim, ao invés de como meio, estaria longe de promover seres humanos livres, justos, dignos e comprometidos com a espécie.
Em contrapartida, é verdade que a ausência de tais condições não poderia favorecer o desenvolvimento de um Estado civil capaz de administrar perfeitamente a liberdade e, consequentemente, promover a justiça, tampouco contribuir para o aumento da capacidade humana de agir moralmente, ou seja, dignamente. Assim, liberdade, justiça e dignidade despontam como aspectos vinculados à humanidade que encontram lugar fecundo para seu desenvolvimento e realizabilidade na sociedade civil. Muito embora seja esta também palco de toda sorte de obstáculos a esse progresso, quer pelo excesso de coerção exercida pelas leis, quer pela preeminência da defesa de interesses particulares, portanto, de um imoralismo político, quer pela acomodação e covardia, ou, em síntese, pelo fato de que a liberdade, bem como o aperfeiçoamento de tudo que se acha estritamente ligado a ela é fruto de um agir que depende apenas de um princípio interno de autodeterminação. Nessa perspectiva, a relação entre liberdade, justiça e dignidade, nos remete, evidentemente, para a compreensão kantiana acerca da fundamentação metafísica de tais conceitos, mas nos lança ainda no âmago de um desafio muito mais complexo que é o de refletir acerca de sua aplicação no mundo prático.
São questões como essas, fomentadas quer pelo pensamento de Rousseau, quer pelo de Kant, que fortalecem a convicção de que podemos insistir na leitura e discussão de textos de tais pensadores, tornando-a solidária das aventuras do pensamento vivo, porque trata-se de mostrar como, para além do tempo lógico, uma filosofia conhece uma espécie de tempo transversal por meio do qual o presente pode colocar questões e trabalhar as respostas do passado. A transversalidade do tempo filosófico indica que o presente nada mais é do que o ponto de confluência onde a multiplicidade do passado se atualiza, pois, todo grande debate que se insere na história da filosofia é capaz de expor os regimes de tal atualização. Por isto, ele já é, desde o início, filosofia.